"Um mesmo livro nunca é o mesmo para duas pessoas." Ferreira Gullar



19 de junho de 2011

Colocando as leituras em dia...

Água para elefantes

De-li-ci-o-so!

Ainda bem que cedo aos meus impulsos de vez em quando... Água para elefantes (Sara Gruen, Sextante) é um livro pra lá de bom, com um enredo muito bem bolado, em torno das memórias do protagonista - um homem de mais de 90 anos - do período em que trabalhou como veterinário num circo, na época da Grande Depressão. Interessante é perceber como o conflito, apresentado logo de cara, vai sendo desenvolvido sem pressa, mexendo com os nervos do leitor! Melhor ainda é notar que aquilo que em princípio era revelador sobre o desenvolvimento do enredo passa a um plano secundário, graças a revelações que vão se descortinando aos poucos... O narrador personagem tem uma força que contrasta com sua idade avançada e uma capacidade de linkar fatos que proporcionam uma versão surpreendente de sua história, assim como de seu envolvimento com os demais personagens, pricipalmente com Rosie, a elefanta aparentemente estúpida que acaba salvando o circo e a vida do próprio protagonista!

Ainda não assisti ao filme, mas pretendo, se não para comparar, pelo menos para observar como foi transmitida a relação ímpar de Jacob com a personagem mais apaixonante da obra: Rosie! É emocionante...

O senhor dos ladrões

Depois de gostar muito de um livro, tenho a tendência de ler outros do mesmo autor. Naturalmente, o que busco é o senso de originalidade que pontuou a obra anterior, de forma que não me decepcionei ao ler O senhor dos ladrões (Cornélia Funke, Cia das Letras).

O livro, apesar da classificação infanto-juvenil, é muito curioso, desde a caracterização dos personagens e do cenário - um pequeno grupo de crianças órfãs que vive num cinema abandonado numa Veneza deslumbrante, repleta de casarões e praças - Vespa, Mosca, Riccio e principalmente o 'senhor dos ladrões' - o garoto Scipio, o qual usa máscara negra e botas de salto -, assim como os irmãos Próspero e Bonifácio, em torno dos quais a narrativa gira.

O mais surpreendente, no entanto, não é uma coisa nem outra, mas sim a habilidade com que a autora delineia uma história paralela, que vai sendo apontada lentamente, de forma que a temática inicial (o envolvimento de um detetive muito tolo e engraçado na busca dos dois irmãos!) vai sendo desvendada e o leitor começa a se perguntar, então, o que virá a seguir, pois parece que a história tem de terminar, mas ainda há muitas páginas a serem lidas... aí tem início a segunda parte da história: o papel da asa, objeto (mágico!) que deve ser roubado pelo 'senhor dos ladrões' e que conduzirá o grupo de amigos à maior aventura de suas vidas!

O desfecho é, portanto, tão fascinante e surpreendente quanto o restante da narrativa, mantendo a sensação de estarmos diante de uma obra que diz a que veio! É show!

Coração de tinta

Falando em trilogias encantadoras... Coração de tinta (Cornélia Funke, Cia das Letras) é uma narrativa fantástica! Por trás de uma história simplista, encontra-se o elemento mágico: o reconhecimento do poder da palavra, um poder tão especial que é capaz de mudar o rumo dos fatos!

A autora alemã espelha o mundo em que vivemos sob uma ótica meio impressionista, seja ao representar seus personagens através da ambiguidade de suas ações, seja ao aproximar essas ações de suas emoções... com as quais ela acaba revelando o que, muitas vezes, não desejamos perceber.

O ponto chave da narrativa é a habilidade do protagonista de animar seres dos livros pelo simples fato de ler suas histórias e o quanto esse poder transforma sua vida, assim como (e principalmente!) de sua filha Meggie. Os personagens com os quais terão de partilhar seus momentos são reconhecidamente divididos entre os 'bons' e os 'maus', num claro exemplo de que a obra tende a proporcionar momentos de reflexão, mas não necessariamente de mudar a nossa perspectiva dos acontecimentos.

Obra linda... Merece nota dez! (assim como espero que a continuação mereça...)

A bússola de ouro

Lindíssimo o primeiro volume da trilogia de Philip Pullman (Ed. Objetiva), o qual apresenta uma narrativa perspicaz sobre a natureza humana num plano diferente do nosso... mas ainda assim verossímil!

As relações travadas por Lyra, a protagonista que não passa de uma criança, com o mundo - e nele elementos fundamentais à existência, como família, amigos, educação... - são marcadas pelo tom certo de tensão, que preenche a necessidade do leitor de encontrar um caminho para a menina e seu dímon. Os encontros e desencontros de Lyra com tudo que lhe é mais caro e, naturalmente, distante, marcam sua trajetória ao que é mais importante: a descoberta de si mesma!

Assim, sua existência em Oxford, sua partida com a Sra. Coulter, a viagem com os gípcios, o encontro com as feiticeiras, ou com o aerostata, ou com o incrível urso de armadura... são apenas partes de um reconhecimento de seu poder, principalmente quando ela percebe que consegue ler o aletiômetro...

Incrível... mágico... encantador!

Que venham os outros dois livros da série!

Tudo que é sólido pode derreter

À primeira vista, Tudo que é sólido pode derreter (Rafael Gomes, Leya) não atrai o leitor! Apesar da história ser atual, tem um começo morno, meio cansativo... e pra piorar, saiu de uma série de TV (não quero ser preconceituosa, mas já é a segunda vez que cito esse fato só hoje!)...
Mas sabe que ele tem uma pegada interessante? Vencendo a resistência inicial - provocada principalmente pelo fato de que não fui eu que o escolhi, ele veio a mim! - reconheci no livro uma narrativa movimentadíssima e atraente, até porque envolve LITERATURA! A menina aí da capa é Thereza, a protagonista; a narrativa começa com o primeiro dia dela no 1º ano do ensino médio, suas relações em casa (é filha única), com as meninas na escola e com os meninos, claro, em especial Letícia - a melhor amiga -, Marcos - o melhor amigo - e João Felipe - o amado!

Independente de parecer meio clichê logo de cara, a história deslancha, sempre envolvendo a grande arte: a literatura; as obras trabalhadas na escola sempre acabam inspirando algo na vida da personagem e em seus enredos pessoais! Há passagens hilariantes em que a personagem "vive" as obras, e isso é muito bom... achei bem legal! Compensa a leitura das mais de 450 páginas...

Orgulho e preconceito

Depois de uma aula no começo da última semana na qual citei algumas passagens de Orgulho e preconceito (Jane Austen, L&PM), fiquei com muita vontade de reler esse clássico e percebi que nunca escrevi nada sobre ele! Assim, pus mãos (e olhos!) à obra e reli a deliciosa aventura amorosa da Srta. Elizabeth Bennet e Mr. Darcy... Como é fantástico o trabalho da autora na construção de seus personagens! Independente de não sabermos exatamente como são, afinal, ela não determina seus aspectos físicos, os conhecemos intimamente, o que conduz à leitura mais atenta dos dois grandes temas que são abordados frequentemente nos diálogos extremamente sagazes entre os personagens: o orgulho e o preconceito.

Acredito que esse é o tipo de texto que deve ser lido várias vezes, pois a cada nova leitura um outro olhar se descortina, uma outra observação é realizada... e os personagens evoluem na sua 'dança' de encontros e desencontros, numa das mais belas histórias de amor que conheço! Não é pra menos que se tornou um clássico!

A garota da capa vermelha

Era uma vez uma garota que ia se casar com um ferreiro...

Era uma vez um lenhador que queria fugir com ela...

Era uma vez um lobo...


É com essa chamada, em vermelho, na contracapa, que A garota da capa vermelha (Sarah Blakley-Cartwright e David Leslie Johnson, iD editora)apresenta sua história nada convencional. Interessante que convence -principalmente num universo já tão recheado de vampiros e outros monstros! Mas a leitura, além de não guardar um elemento mágico capaz de aguçar os sentidos, é tão água com açúcar que enjoa...

Gostei da narrativa, considerei atraentes a caracterização das personagens e o cenário meio funesto em que se passam os acontecimentos, mas falta à obra um "quê", algo que a torne mais... envolvente, talvez! Não gosto de parecer preconceituosa, mas um romance que nasce de um roteiro não me parece adequado!

O clímax da obra fica por conta da desconfiança de Valerie, a protagonista, de quem seria o lobo/lobisomem que ataca a aldeia onde vive, em noites de lua cheia: as passagens em que a nossa Chapeuzinho dark desconfia da avó, do amado, enfim, de todos... são um presente depois de momentos açucarados - e outros muito cruéis pro meu gosto! - de mais da metade do livro! Infelizmente, o final é decepcionante, mas enfim... ACREDITE NA LENDA, CUIDADO COM O LOBO!