Há tempos me pedem para escrever sobre A sombra do vento (Carlos Ruiz Zafón, SUMA de Letras), mas não é uma tarefa fácil! Quem pediu sabe que é verdade... Esse livro é tão denso, tão cheio de meandros, que seria simplista demais fazer uma resenha crítica. Ele merece mais!
Há obras que nos encantam, que mexem com nosso âmago, que nos deixam sem fôlego... A sombra do vento é exatamente desse tipo! Gosto dessas sensações... elas ficam para sempre conosco, como elementos fantásticos: a incrível semelhança entre as histórias de Julián Carax e de Daniel Sempere ("Para meu amigo Daniel, que me devolveu a voz e a pena."), os sofrimentos impostos a ambos, a solidão, o vazio ("senti que me pedia pra viver por ele...")... o lado mais "florido" da narrativa, como a beleza de Penélope Aldaya ou de Clara Barceló ou de Nuria Monfort ou de Beatriz Aguilar... a amizade de Fermín Romero de Torres e de Miquel Moliner... a maldade de Fumero... os passeios pela Ramblas ou pelas praias... detalhes de uma Barcelona marcada pelos horrores da guerra e, ao mesmo tempo, pelo fascínio do amor...
Contudo, fica principalmente o momento mágico da descoberta do Cemitério dos Livros Esquecidos ("... o que você vai ver hoje não pode contar a ninguém."), como "uma grandiosa homenagem ao poder místico dos livros", conforme a contracapa da obra... enfim, uma belíssima e eclética narrativa que nos faz lembrar do poder dos livros!
"Enquanto os outros se lembram de nós, continuamos vivos."
Nova obra de John Boyne (O menino do pijama listrado!), O garoto... (Cia das Letras) é um livro interessante que lembra muito alguns clássicos, como A ilha do tesouro (R.L. Stevenson) ou Robinson Crusoé (Daniel Dafoe), apostando num garoto de 14 anos como narrador protagonista, empreendendo aventuras inimagináveis no mar! O "fundo" da narrativa é real: uma expedição inglesa, de 1787, com destino ao Taiti, que não retorna à Inglaterra por ocasião de um motim. O garoto (John Jacob Turnstile) é uma figura fascinante! Um ladrãozinho com passado obscuro, o qual vai se revelando aos poucos, que conquista o leitor, da mesma forma que conquista a atenção e o respeito do comandante da embarcação, Capitão William Bligh. Apesar de envolvente, o novo romance de Boyne exige um leitor atento e sem reservas, do tipo que topa enfrentar uma narrativa que cresce aos poucos, como uma verdadeira obra de arte, mas que não tem pressa de acabar!
