"Um mesmo livro nunca é o mesmo para duas pessoas." Ferreira Gullar



22 de julho de 2010

"... sentindo aquele perfume mágico de promessa dos livros novos..."

Há tempos me pedem para escrever sobre A sombra do vento (Carlos Ruiz Zafón, SUMA de Letras), mas não é uma tarefa fácil! Quem pediu sabe que é verdade... Esse livro é tão denso, tão cheio de meandros, que seria simplista demais fazer uma resenha crítica. Ele merece mais!
Há obras que nos encantam, que mexem com nosso âmago, que nos deixam sem fôlego... A sombra do vento é exatamente desse tipo! Gosto dessas sensações... elas ficam para sempre conosco, como elementos fantásticos: a incrível semelhança entre as histórias de Julián Carax e de Daniel Sempere ("Para meu amigo Daniel, que me devolveu a voz e a pena."), os sofrimentos impostos a ambos, a solidão, o vazio ("senti que me pedia pra viver por ele...")... o lado mais "florido" da narrativa, como a beleza de Penélope Aldaya ou de Clara Barceló ou de Nuria Monfort ou de Beatriz Aguilar... a amizade de Fermín Romero de Torres e de Miquel Moliner... a maldade de Fumero... os passeios pela Ramblas ou pelas praias... detalhes de uma Barcelona marcada pelos horrores da guerra e, ao mesmo tempo, pelo fascínio do amor...
Contudo, fica principalmente o momento mágico da descoberta do Cemitério dos Livros Esquecidos ("... o que você vai ver hoje não pode contar a ninguém."), como "uma grandiosa homenagem ao poder místico dos livros", conforme a contracapa da obra... enfim, uma belíssima e eclética narrativa que nos faz lembrar do poder dos livros!
"Enquanto os outros se lembram de nós, continuamos vivos."

21 de julho de 2010

Entre a ficção e a realidade


Há muito tempo um livro não me fazia chorar!
Eu sou Alice (Melanie Benjamim, Ed. Planeta) é daqueles livros mágicos, incrivelmente bem escritos, que mexem com a emoção... e com a imaginação! Mistura de drama e narrativa de aventuras, traz à tona a "verdadeira" história de Alice, aquela do País das Maravilhas, tão em voga ultimamente, por causa do filme de Tim Burton.
O que mais instiga o leitor é a relação da pequena Alice Liddell, aos sete anos, mais tarde aos dez e aos onze, e Lewis Carroll (pseudônimo do Sr. Dodgson), vinte anos mais velho! Nos longos meses de primavera e verão da Inglaterra, a partir de 1856, foram companheiros de brincadeiras e histórias, situações contadas até de forma ingênua, mas que sugerem uma pitada de malícia! Uma relação que nunca fica totalmente clara, mas que é a fonte da tragédia na vida de Alice... ao mesmo tempo que a marca indelevelmente como a menina do livro - "Ai, meu Deus, estou cansada de ser Alice no País das Maravilhas"!
Não tenho hábito de ficar só contando livros aqui (até porque acredito que muito melhor é lê-los!), porém há três coisas que saltam aos olhos nessa obra, além da muito estranha relação entre Alice e Sr. Dodgson. Uma delas é a figura materna! A mãe de Alice é ao mesmo tempo forte e imperativa, mãe zelosa e carrasco, o afago e a dureza, a presença doce e ao mesmo tempo cruel... uma mistura antitética que é muito difícil imaginar, mas que deve se assemelhar às mães daquele tempo. A própria protagonista em determinado momento se parece muito com essa imagem, ao falar e cuidar dos filhos!
É aí que surge o segundo ponto: como mãe, depois de tudo que viveu (e sofreu!), espera-se que Alice seja diferente... que aja mais com o "coração", que se entregue à beleza e à ingenuidade da infância, que seja novamente a menina espevitada a brincar com os filhos, mas ela faz somente repetir as ações da mãe. Marcada por um passado de dor e de sombras, não consegue reencontrar aquela Alice criança, até porque ela representa os segredos desse passado que não deseja remexer!
Por fim, e ainda não distante dos dois exemplos anteriores, o amor de Alice pelo príncipe Leopold, não "concretizado" em razão do suposto escândalo que a envolvia com o Sr. Dodgson, deixa rastro em vários momentos de sua história, mas principalmente no nome do segundo filho, um dos que ela vai perder na I Guerra!
Incrível pensar que uma narrativa eletrizante como a que nasceu com a pequena Alice tenha provocado uma existência de tanta dor e frustrações! Dá vontade de contar mais e mais...
Amei o livro! Nota mil...

20 de julho de 2010

Resgate!

Andei resgatando algumas postagens mais antigas em razão dos projetos de leitura. Apenas uma tentativa de despertar algo nos meus queridos leitores! Espero que aproveitem...

O menino do pijama listrado

Andei lendo numa Veja, nesse período de férias (de 2009), uma crítica ao filme (e, indiretamente, ao livro!) O menino do pijama listrado (John Boyne) e, com sinceridade, não a compreendi.
A impressão que tive foi de que o protagonista, o garoto Bruno, deveria representar o "vilão" e teria sido 'pintado' com certa falsa ingenuidade pelo autor! Ou seja, somente por pertencer a uma família cujo patriarca servia a Hitler no período da 2ª Guerra, naturalmente, ele já estaria enquadrado nos "maus"!! Sabe-se que não há o que impeça, hoje, de existirem opiniões, consensos, sobre "tipos", "grupos", "associações",... quaisquer nomes que desejem dar a quem pratique ações em nome de uma coletividade, afinal, as pessoas veem o que querem e como querem, mas é severo demais afirmar que o menino não pudesse ter, aos nove anos, sentimentos que o distinguisse dos de seus pares, mesmo que esses sejam sua família!! Não se pode afirmar que essa criança, por nascer em um desses grupos, está fadada, desde cedo, a ser o que a hereditariedade ou o meio determinam (voltaríamos, então, às teorias deterministas do final do século XIX?!?), até porque ela depende de outros fatores que são formadores de sua personalidade e, afinal, a obra é uma ficção... é arte!
O livro em si é interessante: desde a linguagem, a qual mexe com o intelecto do leitor, sugerindo situações e pessoas, em vez de citá-los diretamente (como Haja Vista ou o Fúria!!), assim como a relação inocente de Bruno e Shmuel, a qual encontra forte contraponto na frieza da irmã do protagonista, e ainda na brutalidade de seu pai - ou na dos atos que ele representa!
Já o filme faz uma boa leitura do livro, mas não consegue representar a relação entre as personagens e especialmente o final com o mesmo peso...
Boyne surpreende justamente por não preparar o terreno ao leitor... E talvez (se quisermos insistir em rotulá-la!) de piegas a obra tenha apenas o final, como numa parábola, com grande lição de moral!! Depende do ponto de vista...

O garoto no convés

Nova obra de John Boyne (O menino do pijama listrado!), O garoto... (Cia das Letras) é um livro interessante que lembra muito alguns clássicos, como A ilha do tesouro (R.L. Stevenson) ou Robinson Crusoé (Daniel Dafoe), apostando num garoto de 14 anos como narrador protagonista, empreendendo aventuras inimagináveis no mar! O "fundo" da narrativa é real: uma expedição inglesa, de 1787, com destino ao Taiti, que não retorna à Inglaterra por ocasião de um motim. O garoto (John Jacob Turnstile) é uma figura fascinante! Um ladrãozinho com passado obscuro, o qual vai se revelando aos poucos, que conquista o leitor, da mesma forma que conquista a atenção e o respeito do comandante da embarcação, Capitão William Bligh. Apesar de envolvente, o novo romance de Boyne exige um leitor atento e sem reservas, do tipo que topa enfrentar uma narrativa que cresce aos poucos, como uma verdadeira obra de arte, mas que não tem pressa de acabar!

Boa companhia: POESIA

O poeta Cassiano Ricardo ofereceu a seus leitores, no Modernismo, um dos mais belos significados de poesia

O que é poesia ?
Uma ilha cercada de palavras por todos os lados.

Assim, poesia - que é uma arte literária e, como arte, recria a realidade - apresenta um outro mundo “mais bonito ou mais intenso ou mais significativo ou mais ordenado – por cima da realidade imediata”, de acordo com o poeta Ferreira Gullar.
As turmas do 1º ano do médio têm uma excelente oportunidade de vislumbrar esse universo fantástico da poesia através de duas obras muito diversas, uma que reúne vários poetas contemporâneos : Boa Companhia-Poesia e uma novela, quase romance, de Alessandro Baricco: Seda.
Da exploração do espaço, do ritmo, da métrica e da rima de uma, para a narrativa permeada de conotação da outra, surgem relações entre os universos da prosa e da poesia, leituras intertextuais que permitem explorar esse rico trabalho com a palavra exatamente através da visão modernista de Cassiano Ricardo... No final de tudo, enfim, o questionamento permanece: e pra ti, o que é poesia?

4 de julho de 2010

Era uma vez...

... a época em que eu lia três livros por mês e postava apaixonadamente nesse blog! :(
É, já havia previsto que esse ano não seria fácil, mas não imaginei que seria quase impossível dedicar uma partezinha ínfima do meu tempo a essa tarefa adorável! Não adianta reclamar nem tentar justificar... é preciso mudar... vou tentar, então, mais uma vez!